domingo, 17 de agosto de 2008

A MENINA E O VENTO

Nenhuma tarde foi como aquela, e, talvez, nunca será. Deus, se realmente existe, estava de bom dia e o diabo se aposentou, foi dormir ou morreu! E esse tipo de entidade morre? Naquele dia lindo, ele morreu por pelo menos duas horas.

A menina veio correndo. Nem mesmo ela, dentro daquele cenário fantástico, acreditava. Tocava o chão para se certificar da verdade do cenário; sentia o cheiro das árvores (um cheiro sensível e sutil) e tocava o nariz para saber se não estava gripada. Não, não estava. Deitou-se. Cantou uma daquelas músicas que só as crianças sabem. E sabem o que mais? Era uma sinfonia orquestrada com o canto em uníssono dos pássaros-tenores. Ela não cansava do descanso, porém, restavam apenas duas horas. Tinha que aproveitar.

Correu, correu, correu...o vale não chagava ao fim, mas sua casa, que deixara para trás, diminuía a cada passo. Então, ele veio: o vento.

Primeiramente, suave (ela se assustou – um daqueles sustos gostosos que faz a mamãe gritar quando, distraída na cozinha, a menina agarra o tornozelo da mãe). Desta vez, o protagonista, era o vento.

Bailava em todos os cantos que a visão de menina permitia. Uma valsa bailada e fácil de perceber. O vento dançava para acolá e a árvore reverenciava; o vento gingava para ali e o mato se ajoelhava. O vento estava feliz.

Ela resolveu acompanhar o bailar do vento. Seu trapo virou vestido de laços azuis celestes (só para combinar com o céu, e que céu!); em seus pés descalços brilharam lindas sapatilhas. Estava preparada para o baile.

A menina flutuou. Foi carregada pelo vento como uma noiva pura, pelo puro vento. E seu noivo não parava. Já cansada, caiu plumadamente, levitada pelo sopro do vento, até tocar o chão.

Conversaram por muito tempo. Riram das figuras extravagantes das nuvens. O vento beijava, novamente, seu corpo: um calafrio. O vento afagava sua pele: uma tremedeira. O vento soprava e abria a flor do seu sexo. O vento respingava a água das nuvens. Era chuva ou prazer? O vento soprava seu cabelo. O vento modificava o tempo. Mas o tempo não pára e já estava se esgotando. “Só mais um minuto! Só mais um segundo!”. “Não, acabou!”.

Tudo voltou ao normal. O vento se foi. O vento deixou uma leve brisa no ventre e no coração da menina. Será que voltará o seu amante? Virá como uma ventania? Um furacão? Um tufão?

A menina voltou para casa. Estava descalça e com seus trapos, novamente; com o corpo sujo, contudo, sua alma estava vestida com glamour e o coração limpo.

Aquela menina nunca mais teve um vento como aquele. O demônio despertara enfim. Deus, se é que ele existe, descansou, pois estava cansado e sem fôlego de tanto soprar.

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