terça-feira, 18 de maio de 2010

Voltei para casa e antes de entrar uma mão pousou sobre meu ombro e apertou com firmeza. Desejei que fosse meu carrasco, que me prendesse em uma câmara de gás e deixasse que o ar envenenado preenchesse meus pulmões fazendo sufocar a vida, fazendo sufocar os sonhos, fazendo sufocar a dor de uma única vez. Tive coragem e levantei os olhos. Aquela mulher vestida de preta nunca esteve tão feia pra mim. Ela tinha os olhos fundos, seu rosto estava envelhecido e aquela luz que sempre emanava, como uma aura, havia sumido tão de repente. Ela me abraçou e voltou a chorar. Era ela que sempre tocava meu ombro, era ela que sempre me fazia desejar a morte. Impossível. Levantou-se e se sentou junto às muitas pessoas que enchiam a sala de nossa casa.
Olhei a escada e algo me atraía, algo em impedia a subir. Estava diante do quarto. Abri a porta e senti um ar úmido. Fechei as janelas. Corri os olhos pelo lugar e com uma saraivada de pensamento tudo veio à tona. Eu acordara, eu finalmente acordara de meu transe. Sentei na rede de meu pai, toquei o lugar em que por tanto tempo ele repousou seu corpo cansado do trabalho pesado. Abri o guarda-roupa e o cheiro de seu corpo tocou meu espírito tão fundo que desejei sumir. Finalmente eu chorei, chorei tudo aquilo que não conseguia chorar. Eu gritei, gritei tão alto que todo o planeta acordou. Eu engolia as lágrimas, eu agarrava o invisível, eu socava o nada. Algo dentro de mim não queria parar, não queria deixar de remoer dentro do meu estômago. Eu soluçava agarrava todas as coisas ao redor como um relicário. Eu sabia chorar. Eu sabia chorar. Eu podia sentir. Eu morri ali mesmo. Eu juro que morri.

Para meu pai.
Bruno Sérvulo

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